Se estiver na casa acima dos trintas concerteza que se recorda com
alguma nostalgia do tempo em que era difícil vislumbrar na TV portuguesa um
filme com um pouco mais de pele feminina a descoberto, e mesmo quase impossível
ver situações de nudez completa e acções de sexo, mesmo que rápidas e
dissimuladas.
Era preciso esperar pelas altas horas da noite, na programação da
madrugada (que ridicularmente a maioria pensava que ninguem via) para se ter o
prazer de ver um conteúdo mais picante, ou então rezar para que as célebres
TV´s piratas conseguissem emitir e apresentassem aqueles concursos com uns
strips á mistura (quem não se lembra do célebre Tutti Frutti ?) ou mesmo os
filmes eróticos que a tradicional RTP nunca ousaria exibir, e muito menos
depois do escandalo do Império dos Sentidos.
Eram tempos em que a pornografia ainda era vista como algo
pecaminoso e proibido e em que mesmo o erotismo chegava ao ponto de ser
assumido como pornografia.
Os escassos exemplos de conteúdo erótico da altura começaram a
surgir de uma forma quase amedrontada e sempre invariavelmente sustentados (e
justificando dessa forma a presença do nú) ou como algo artístico ou como
comédia, a chamada “comédia sexy italiana” de que são exemplo os inesquecíveis
filmes do pequeno, pencudo e rechonchudo Alvaro Vitali.
Em ambos os casos, arte ou comédia, a origem é a mesma…Itália ! Em
nenhum outro país foi possível observar um movimento pro-erotismo no cinema
como aquele que foi desenvolvido em Itália nos anos 70 e 80. Movimento esse que
teve como expoentes máximos Tinto Brass ou Joe D`Amato.
Tinto Brass, neto de um famoso artista italiano, trabalhou e
aprendeu com os grandes mestres do cinema italiano Fellini e Rossellini, e
quando enveredou pela sua carreira de realizador foi o pimeiro a juntar a nudez
e o erotismo á premiada arte cinematográfica italiana.
A sua obra e filmes como Salon Kitty ou Paprika são ainda hoje
considerados os expoentes máximos do cinema erótico. A sua mais famosa obra é
no entanto a mais polémica, Caligula. Uma produção milionária da Penthouse que
juntou um grande elenco e cenas de sexo explícito. Foi um sucesso de bilheteira
mas uma desilusão para Tinto Brass, que nunca concordou com a inclusão de cenas
de sexo explícito no filme exigida por Bob Guccione, o patrão da Penthouse.
Tinto Brass sempre quis separar as águas entre erotismo e
pornografia dizendo mesmo que “A pornografia existe para te dar uma erecção, o
erotismo existe para te dar emoção”
Já Joe D`Amato enveredou por um caminho diferente, depois de começar
como assistente de fotografia, de camara e de realização iniciou-se na
realização a solo em filmes de baixo custo e de terror até entrar no cinema
erótico com alguns filmes da saga Emanuelle.
Dos vários realizadores da saga, os filmes Emanuelle realizados por
Joe D`Amato foram exactamente aqueles mais explicitos, como Emanuelle na
America.
O ponto de partida para que Joe envereda-se mais tarde para o passo
seguinte e final, a entrada na realização de filmes pornográficos, tornando-se
um dos nomes mais conhecidos da Indústria.
Estava criada a base para o surgimento de uma vaga de produções
pornográficas de origem italiana e para o surgimento de realizadores como Mario
Salieri, Andy Casanova, Max Bellochio, Silvio Bandinelli ou António Adamo que
dominaram o mercado nos anos 80 e 90.
Em comum, um estilo muito próprio, que mistura sexo com história,
com planos e enquadramentos longos e de camara fixa e com as belas mulheres
italianas, que conquistou adeptos e que ainda hoje é a característica
diferenciadora dos filmes para adultos made in Italy.
Texto publicado na edição de Fev 14 da revista Frontal Mag